sexta-feira, 13 de setembro de 2019

E SE O AMAPÁ NUNCA TIVESSE SIDO CRIADO?

Recorte do mapa do Estado do Pará em 1923
(Arquivo Nacional)

Antes de tudo, é preciso dizer que a historiografia séria não trabalha com “achismos” ou com “e se...”, pois bem, então vamos ao nosso exercício de imaginação, que abre um leque de infinitas possibilidades e teorias. Teorizar sobre cenários históricos hipotéticos, chama-se "história contrafactual", que na realidade está mais para um ramo da ficção do que para a historiografia. Dito isto então vamos lá! 

Mesmo nos dias atuais pouquíssima coisa diferencia amapaenses de paraenses, o mesmo sotaque chiado com o uso do “égua” e suas variantes, o mesmo emprego do “tu” ao invés de “você”, a mesma culinária com açaí, maniçoba, vatapá e tacacá, sem falar no círio de Nazaré e tecno-brega, de vários modos o Amapá tem mais em comum com o Pará que o próprio sul do Pará, que tem uma forte influência mineira e goiana. Mas e se Vargas nunca tivesse assinado o decreto 5.815 em 13 de Setembro de 1943? Bem, para começar a responder essa pergunta, talvez devêssemos olhar para o atual noroeste do estado do Pará, onde estão os municípios de Almeirim, Prainha, Monte Alegre, Alenquer e assim por diante, os municípios a margem esquerda do rio Amazonas, até por que, as terras que viriam a ser o Amapá, nada mais eram do que uma continuidade dessa região, então norte do Pará, estes municípios tem hoje uma média de 42 mil habitantes cada, um IDH (índice de Desenvolvimento Humano) em torno de 0,580, considerado baixo e um PIB per Capita em média de R$ 10.623, considerado mediano, ou seja, nada muito animador.


Vista Parcial da frente do município de Prainha, noroeste do Pará
(Blog do Noblat)

É bem provável que sem a instalação do território e posteriormente do estado, tivéssemos menos municípios, menos gente, e menos serviços públicos e privados por esses lados, municípios como Itaubal, Cutias, Pracuúba entre outros provavelmente não existiriam, é possível que apenas localidades mais antigas como Macapá, Mazagão, Amapá e Oiapoque existissem hoje como municípios. A Macapá que conhecemos e que junto a Santana concentra 75% da população amapaense, seria bem diferente, primeiramente teria uma população bem menor, e menos diversificada, lembremos que o Amapá desde a instalação do território foi um local de atração populacional, sem a máquina econômica movida pelo setor público da atualidade, a economia dos municípios da região continuariam girando em torno da pecuária, da agricultura de subsistência e do extrativismo, com isso o fluxo migratório de paraenses, de nordestinos, sulistas, goianos etc. seria desviado pra outros lugares como a própria Belém que seria ainda maior e mais inchada que hoje, como também para Manaus e para a Guiana Francesa.

Centro histórico colonial de Macapá em 1908
(Álbum do Estado do Pará 1908)

Por outro lado Macapá provavelmente teria mantido seu centro histórico colonial que foi destruído pelo processo de “modernização” e “embelezamento” promovido durante o período territorial, quanto a tradicional população negra que habitava a frente da cidade provavelmente continuaria por lá por muitas décadas, quem sabe até a atualidade. Macapá teria hoje um centro histórico negro, uma versão bem reduzida e amazônica do Pelourinho de Salvador. Já na economia é bem provável que o projeto ICOMI (Indústria Comércio e Mineração) tivesse se instalado, e Macapá teria uma dinâmica parecida de Oriximiná com a MRN (Mineração Rio do Norte), Serra do Navio dificilmente teria se transformado em município após a saída da ICOMI, sendo hoje mais parecida com uma cidade fantasma, algo como Fordlândia.


Frente de Macapá 'Rua da praia"onde hoje é o Macapá Hotel
Região anteriormente habitada pela população negra
(Álbum do Estado do Pará 1908)
Mas no século XXI a região já seria emancipada né? Bem, provavelmente não. No dia 11/12/2011 realizou-se no Pará o primeiro, e até hoje. o único plebiscito na história do Brasil, onde a população foi consultada se queria ou não dividir seu estado para dar origem a outro. Lembremos que quase todos os desmembramentos na história do Brasil se deram sob governos ditatoriais. Também temos que lembrar que as regiões que pleitearam a separação do Pará (Sul e oeste do estado), contam com importantes cidades médias, que são importantes polos econômicos e de poder de elites locais, tais como Marabá, Santarém, Altamira e Itaituba, algo que provavelmente não teríamos nestas bandas, com isso as elites e oligarquias locais não teriam o poder político e econômico necessários para mobilizar as massas, como no sul e oeste do Pará, ficando um eventual movimento separatista no mesmo estágio hipotético que tem hoje o projeto de criação do Território Federal do Marajó ou do Oiapoque. 

O atraso da região em relação a educação e saúde seria muito maior do que é hoje, é provável que ao invés da Unifap, Ueap e Ifap tivéssemos um polo da UFPA, com opções bem limitadas de cursos, fazendo com que os jovens fossem pra Belém cursar nível superior, algo que durou com maior intensidade até os anos 90. As idas a Belém para resolver problemas mais complexos de saúde, documentação entre outros também seriam ainda mais recorrentes que nos dias atuais. O barco provavelmente continuaria a ser o rei do transporte por essa região, viação aérea seria reservada para emergências ou para os super-ricos. Ademais continuaríamos reunindo a família pra comer pato no tucupi todo segundo domingo de outubro, e indo para nossas festas de aparelhagem.