Foto: httpviatrolebus.com.br |
A
sociedade brasileira é excludente e desigual, isso é praticamente consenso
entre todos os brasileiros que tem o mínimo de sensibilidade, e a desigualdade
se verifica das mais diversas maneiras, seja na diferença salarial entre homens
e mulheres, brancos e negros, seja no nível de escolaridade enfim a desigualdade
pode ser evidenciada de diversas maneiras, porém o que poucos debatem, mesmo
entre os setores mais progressistas, é a desigualdade social em se tratando de
mobilidade urbana, o que é fundamental de ser analisado se queremos uma
sociedade mais justa, a mobilidade urbana é um elemento vital que pode criar um
abismo entre a qualidade de vida daqueles que podem e os que não podem se
deslocar adequadamente pela cidade.
Uma
cidade só existe para quem por ela pode se movimentar, porém segundo a Associação
Nacional das Empresas de Transportes Urbanos – ANTU, mais de 37 Milhões de
brasileiros não tem dinheiro para pagar as tarifas regularmente, e para uma
família com renda média mensal de um salário mínimo, o gasto com transporte
mesmo com meia passagem chega a 33% do orçamento familiar segundo o Movimento
tarifa zero de São Paulo, ou seja, a mobilidade urbana em nossas cidades é tão
desigual quanto nossa sociedade, circula quem tem condições de circular, quem
não tem fica imóvel, e é justamente o que acontece com uma parcela
significativa dos brasileiros, infelizmente a mobilidade urbana foi
transformada em mercadoria, o que não podemos permitir visto que a mobilidade é o direito que garante o acesso a todos os outros direitos.
Uso de transporte individual e coletivo
por renda familiar
(fonte: Pesquisa de Mobilidade Urbana/ Metrô, 2012)
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Como
se não bastasse esse quadro já alarmante, os governos, os lobbies do transporte
público e os diversos agentes modeladores do espaço urbano continuam
perpetuando a lógica do urbanismo rodoviarista, onde para cada 1 (Um) Real
investido em Transporte público os governos gastam em média, outros 12 (Doze)
reais em obras e infraestrutura de incentivo a carros e motos, sendo que mais
de 70% das movimentações dentro das cidades, em geral são feitas por
transportes públicos e não por automóveis particulares. Toda a concepção atual
de transporte público está organizada para garantir o maior lucro possível aos
empresários, mais gente dentro do mínimo de ônibus possível, logo menor custo
com manutenção e funcionários igual a maior lucratividade, e o próprio trajeto
das rotas de ônibus se limitam a lógica Centro-Periferia, ou seja, Escola/Trabalho
– Casa, como se a população tivesse como único direito exclusivo trabalhar ou estudar
e voltar para casa, e o pior maior parte dos equipamentos culturais encontra-se
em bairros centrais ou considerados nobres ou então em bairros ultra
periféricos de difícil acesso.
Outra
questão que pouco se debate é o tempo de deslocamento, e a distância do local
de trabalho/estudo para o local de moradia, segundo a pesquisa de Mobilidade Urbana do Metrô de São Paulo de
2012, quanto maior a renda familiar mais se usa o transporte particular e menor
o tempo de deslocamento, e ao contrário quanto menor a renda familiar maior o
uso de transporte público e maior será o tempo de deslocamento. E quanto a
distância entre local de trabalho e local de moradia? Este também é um tema que
poucos estão dispostos a debater. Nas últimas cinco décadas assistimos ao
crescimento colossal da população das cidades brasileiras, porém devido a nossa
urbanização dispersa e horizontal os subúrbios tornaram-se densamente habitados
em detrimento das regiões centrais praticamente desabitadas no período noturno,
enquanto que a lógica deveria ser inversa, as regiões centrais deveriam ser
densamente habitadas predominantemente por populações de menor renda e as áreas
suburbanas deveriam abrigar a população
de maior renda, uma vez que estes tem melhores condições de se deslocarem. Um
exemplo de como o próprio estado favorece esta desigualdade é quando este
instala os grandes projetos habitacionais do Minha Casa Minha Vida em regiões ultra
periféricas onde os terrenos são mais baratos porém a mobilidade urbana é
precária.
O metrô de São Paulo transporta diariamente 3 milhões de pessoas (População do Uruguai) no sentido Zona Leste - Centro - Zona Leste. Foto: qga.com.br |
Como todos os problemas urbanos, a questão da
mobilidade urbana implica em formulação de políticas de longo prazo e que
enfrentem interesses, sobretudo do mercado imobiliário que hoje é o maior
empecilho das boas políticas urbanas, da boa arquitetura e da urbanidade de um
modo geral. Propostas como a da tarifa zero, a desapropriação de prédios abandonados
e terrenos baldios para fins de implantação de habitação de interesse social,
bem como massivos investimentos em transportes coletivos e alternativos podem
ser algumas das saídas para melhorarmos as cidades brasileiras, porém mesmo que
estas políticas começassem hoje com grande pressão e organização da sociedade
civil organizada, ainda sim os resultados práticos começariam a ser sentidos
somente longo prazo, o que mostra a urgência de darmos a devida seriedade ao
tema da mobilidade urbana ainda hoje.
Referências: